Por Eudes Baima Bezerra
Professor do Curso de Pedagogia - FAFIDAM/UECE

Um só Estado, laico e democrático, sobre todo o território da Palestina!


Prof. Eudes Baima
Os trabalhadores em todo o mundo acompanham horrorizados os massacres perpetrados pelo exército sionista de Israel na Faixa de Gaza sob o falso pretexto de "exercer seu direito de defesa".
Em 20 dias, morreram mais de 1300 palestinos, sendo 226 crianças. De Israel, 53 soldados e 3 civis.
Ataques aéreos e bombardeios de artilharia pesada foram lançados deliberadamente contra escolas, hospitais, prédios residenciais na Faixa de Gaza.
Mais de 250 mil pessoas foram expulsas de suas casas e 90% da população de 1,7 milhão de habitantes foi desprovida de energia elétrica.
Em 29.07, uma legenda do jornal "O Estado de São Paulo" dizia mais que a foto: "Gaza, ataques a um parque, ontem, mataram 10 pessoas – sendo oito crianças".


Essa matança é um "conflito religioso"?


Uma propaganda que bombardeia os trabalhadores afirma que o fundo da questão palestina é um conflito religioso que "dura séculos". Nada mais errado. Historicamente, houve, na Palestina, uma convivência pacífica entre as religiões judaica e muçulmana – e também a cristã.
O confronto foi desencadeado pelo surgimento de um movimento político, o sionismo, que buscava um território fora da Europa para ser colonizado exclusivamente por judeus.
Na época do Primeiro Congresso Sionista Mundial, em 1897, a Palestina era parte do império turco-otomano e tinha uma grande maioria de árabes muçulmanos e uma pequena minoria de judeus, além de árabes cristãos.
O sionismo era rejeitado pelos judeus da Palestina e era extremamente minoritário entre os judeus da Europa. Só ganhou força porque, desde sua origem, tornou-se instrumento das grandes potencias imperialistas.
Nas duas primeiras décadas do século XX, do Czar da Rússia, ao Kaiser alemão, passando pelos imperialismos inglês e francês, cada um, para atingir seus próprios objetivos, utilizou-se do sionismo, financiando-o e armando-o.
Após a primeira guerra mundial, com o império turco-otomano desmantelado, o imperialismo inglês assumiu o controle da Palestina já com o objetivo de expulsar árabes para criar um estado sionista na região.
Até o final da década de 1920, apesar de as grandes potencias – em particular os EUA - fecharem suas fronteiras às massas de imigrantes que saíam do leste da Europa, para canalizar os judeus para a Palestina, o número dos que aceitavam ir para lá era insuficiente.
Foi preciso acontecer a segunda guerra mundial e o holocausto nazista, nas décadas de 1930/1940, para que as perseguições aos judeus empurrassem para a Palestina o contingente populacional necessário para garantir a imposição do estado sionista.
"Dois estados" significa reconhecer ao sionismo o direito de expulsar os árabes de suas terras
Em 29 de novembro de 1947, num acordo envolvendo Estados Unidos, Inglaterra, França e a burocracia stalinista que governava a URSS, a recém-criada ONU aprovou a Resolução 181 que dividiu a Palestina em dois estados (com o voto favorável do Brasil).
Naquele momento, com chegada de levas de judeus jogados para fora da Europa, a demografia da Palestina tinha mudado mas, ainda assim, havia uma maioria de 1,1 milhão de árabes e 800 mil judeus.
Os sionistas proclamaram seu estado em 14 de maio de 1948 e, por meio de atentados terroristas, guerras e massacres, ocuparam, em menos de um ano, 78% das terras da Palestina (*).
Hoje, 65 anos e muitas guerras depois, o estado sionista de Israel ocupa 98% do território histórico da Palestina, armado até os dentes, com o quarto orçamento militar do mundo, sendo também o quarto exportador de tecnologia militar, inclusive para o Brasil. Sua lógica é um estado de Israel numa Palestina sem palestinos.
Nos 2% restantes estão vilas e cidades palestinas, recortadas por muralhas, isoladas umas das outras e do mundo, bloqueadas econômica e militarmente. Essa é a ficção do "estado palestino", onde estão amontoados em condições miseráveis cerca de quatro milhões de palestinos (outros 1,3 milhão vivem dentro do estado sionista, sendo cidadãos israelenses de segunda classe – como no apartheid sul-africano; há, ainda, três milhões na diáspora).
O caminho da paz é o caminho da democracia e da soberania nacional, contra o imperialismo
A criação do estado sionista, em novembro de 1947 marcou, também, o declínio da Grã-Bretanha e a ascensão dos Estados Unidos como principal potencia imperialista mundial, assumindo a sustentação de Israel e de sua política.
Mas essa sustentação só pode existir porque, desde então, estabeleceu-se um consenso geral de todos os aparatos dirigentes, dos Partidos Comunistas, Partidos Socialistas, incluindo o Secretariado Unificado pablista, para dizer que a existência do Estado de Israel, tal qual fundado em 1948, não pode ser questionada.
E que a única perspectiva "progressista" seria a criação de um "Estado" palestino ao lado de Israel, tal qual se formulou nos acordos de Oslo (1993), que deram origem à Autoridade Nacional Palestina (ANP) e ao reconhecimento do estado sionista pela Organização da Libertação da Palestina (OLP).
Hoje, Obama pede um cessar-fogo para moderar o barbarismo dos dirigentes sionistas. Ele teme que a indignação e a cólera dos povos, ao lado da resistência heroica do povo palestino, alimente a ampliação das manifestações anti-imperialistas em todo o mundo, inclusive no próprio interior do estado de Israel, tal como ocorreu em Tel-Aviv (capital de Israel), dia 26.07, quando sete mil judeus e palestinos de Israel exigiram o fim da ofensiva militar. Também multiplicam-se casos de reservistas do exército israelense que se recusam a entrar em serviço.
O Brasil, agora acompanhado pelo Chile e Peru, chamou para consultas seu embaixador em Israel e anunciou que ele só retornará após o fim dos bombardeios. É uma atitude que abre a perspectiva de ruptura de relações diplomáticas, mas ainda sem ir ao ponto fundamental que seria a revisão do voto brasileiro na resolução da ONU que criou a política de "dois estados", em 1947.
A recusa obstinada do primeiro-ministro de Israel, Netanyahou, de parar os atos de barbárie na Faixa de Gaza, agora interrompida pela pressão internacional, se inscreve numa situação em que, mergulhado em crise profunda, o imperialismo não consegue controlar todas as situações. E não controla as forças que ele mesmo coloca em movimento, como o Estado artificial de Israel.  Mas o recuo eventual da invasão de Gaza por terra não quer dizer que o massacre do povo palestino tenha sido interrompido. Até que a Palestina seja restituída aos seus legítimos donos, através da constituição de um único Estado constituído sobre todo o território histórico da Palestina, seguiremos vendo os episódios de barbárie que temos presenciado nos 35 últimos dias.


(*) Mais informações em "As origens da divisão da Palestina" no http://otrabalho.org.br/as-origens-da-divisao-da-palestina/